quinta-feira, setembro 30, 2004
José Gomes Ferreira
Eu nem sou um rapaz dado a poesias. Mas na terça-feira passada enquanto estava na biblioteca, reparei no livro Poesia-I de José Gomes Ferreira. Pensei: "Por que não dar uma espreitadela?". Li:
Viver sempre também cansa (1931)
O sol é sempre o mesmo e o céu azul
ora é azul, nitidamente azul
ora é cinzento, negro, quase verde...
Mas nunca tem a cor inesperada
O Mundo não se modifica.
As árvores dão flores,
folhas, frutos e pássaros
como máquinas verdes.
As paisagens também não se transformam.
Não cai neve vermelha
não há flores que voem,
a lua não tem olhos
e ninguém vai pintar olhos à lua.
Tudo é igual, mecânico e exacto
Ainda por cima os homens são os homens.
Soluçam, bebem riem e digerem sem imaginação.
E há bairros miseráveis sempre os mesmos
discursos de Mussolini,
guerras, orgulhos em transe
automóveis de corrida...
E obrigam-me a viver até à morte!
Pois não era mais humano
morrer por um bocadinho,
de vez em quando
e recomeçar depois
achando tudo mais novo?
Ah! Se eu podesse suicidar-me por seis meses
morre em cima dum divã
com a cabeça sobre uma almofada
confiante e sereno por saber
que tu velavas, meu amor do norte.
Quando viessem perguntar por mim
havias de dizer com teu sorriso
onde arde um coração em melodia:
«Matou-se esta manhã.
Agora não o vou ressuscitar
por uma bagatela.»
E virias depois, suavemente,
velar por mim, subtil e cuidadosa,
pé ante pé, não fosses acordar
a morte ainda menina no meu colo...
Viver sempre também cansa (1931)
O sol é sempre o mesmo e o céu azul
ora é azul, nitidamente azul
ora é cinzento, negro, quase verde...
Mas nunca tem a cor inesperada
O Mundo não se modifica.
As árvores dão flores,
folhas, frutos e pássaros
como máquinas verdes.
As paisagens também não se transformam.
Não cai neve vermelha
não há flores que voem,
a lua não tem olhos
e ninguém vai pintar olhos à lua.
Tudo é igual, mecânico e exacto
Ainda por cima os homens são os homens.
Soluçam, bebem riem e digerem sem imaginação.
E há bairros miseráveis sempre os mesmos
discursos de Mussolini,
guerras, orgulhos em transe
automóveis de corrida...
E obrigam-me a viver até à morte!
Pois não era mais humano
morrer por um bocadinho,
de vez em quando
e recomeçar depois
achando tudo mais novo?
Ah! Se eu podesse suicidar-me por seis meses
morre em cima dum divã
com a cabeça sobre uma almofada
confiante e sereno por saber
que tu velavas, meu amor do norte.
Quando viessem perguntar por mim
havias de dizer com teu sorriso
onde arde um coração em melodia:
«Matou-se esta manhã.
Agora não o vou ressuscitar
por uma bagatela.»
E virias depois, suavemente,
velar por mim, subtil e cuidadosa,
pé ante pé, não fosses acordar
a morte ainda menina no meu colo...
Comments:
Se a espera foi para trazer um momento de poesia valeu a pena, parabéns Melga!
Viver cansa, os honens são sempre iguais e se eu pudesse suicidar-me assim, suicidava.
E não haveria nunca o problema de ser acordada antes da hora, como se conta no poema, ninguém quer mesmo saber de desgraças!
Viver cansa, os honens são sempre iguais e se eu pudesse suicidar-me assim, suicidava.
E não haveria nunca o problema de ser acordada antes da hora, como se conta no poema, ninguém quer mesmo saber de desgraças!
... Já agora sugiro: Viver todos os dias cansa, de Pedro Paixão. A leitura é como a net... Palvara puxa palavra... :)
Boa Francisco! bela entrada na poesia e que bom que o olhar na biblioteca não viu só técnicas (eheheh). Essa de morrer uns bocadinhos e ressuscitar...bom se calhar de vez enquando agente até faz de conta que faz isso...na é? Um abraço!
No longinquo Sabugal já se lê poesia, e graças ao Melga, que aderiu aos Blogues Reprodutores de Trechos/Estrofes/Excertos de Romances/Poemas/Contos! Aguardo a reprodução completa da obra! O Sabugal (Vila Boa, Rendo e Terreiro das Bruxas) aguarda. E o Soito!
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